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19-02-2015

Artista brasileiro com Down é estrela em evento na Itália

O artista plástico brasiliense Lucio Piantino foi o convidado especial da mostra Arte in tutti i sensi – arte em todos os sentidos, na prestigiada Galeria Nazzionale Dell’Umbria, no Pallazzo de Priori em Perugia, na Itália, de 1 a 4 de dezembro. A mostra faz parte do projeto Polimatérico, promovido pelo terceiro ano pela Assoziacione Culturalle Cittá del Sole. A pedido da Inclusive, Lurdinha Danezi, mãe de Lucio, que o acompanhou na viagem, fez um relato do evento:

No final de 2013 o Superintendente da Galleria Nazionale Dell’Umbria Fábio de Chirico e o presidente do Centro Studi Cittá Del Sole Giuseppe Capparelli estiveram em Brasília e, passeando pela Feira da Torre se depararam com os quadros do Lucio, olharam cada quadro com admiração e encantamento. Lucio e eu não estávamos lá, então Rosânia, nossa amiga, apresentou o Lucio para os italianos através do portfólio dele. Os italianos perguntaram se havia interesse do artista em expor seus trabalhos na Itália e deixaram um cartão com seus contatos.

Na semana seguinte Rosânia me passou o cartão e falou do interesse dos italianos no trabalho do Lucio. Chequei em casa e mandei tudo que tinha sobre o Lucio na internet inclusive o link para eles assistirem ao documentário “De arteiro a artista: a saga de um menino com síndrome de Down”, de Rodrigo Paglieri, que conta a trajetória de vida e profissional do Lucio.

No começo de 2014 recebi um e-mail convidando o Lucio para participar do evento Polimaterico que seria nos dias 01 a 04 de dezembro na cidade de Perugia, na Itália. Seria o terceiro ano do evento que tem por objetivo promover a aproximação das pessoas com necessidades específicas à arte contemporânea. A participação de Lucio seria como artista convidado para uma exposição individual e como mestre no workshop de pintura para 20 italianos. Foi um dos momentos mais felizes da minha história com o Lucio, ter o reconhecimento do seu trabalho fora do país é de uma importância sem tamanho e Lucio foi, desde o começo, tratado como um artista e respeitado como tal.

Os responsáveis pelo projeto Polimaterico e eu passamos meses fazendo ajustes sobre a participação do Lucio. A Itália ficaria responsável pela estadia, montagem das obras e da exposição e compra do material necessário para o workshop, ao Brasil caberia o financiamento das passagens. Como não conseguimos recursos nem junto ao governo local, nem ao Federal, apelamos para amigos e desconhecidos que foram incansáveis na busca de recursos para financiar as passagens. Fizemos rifa de quadro do Lucio, feijoada, leilão de obras cedidas por amigos entre outras ações.

Conseguimos o dinheiro e embarcamos para a Itália. Ao chegar a Roma havia um carro nos esperando para nos levar à Perugia, foram duas horas de viagem. Chegamos no dia 27 de novembro, pois no dia 28 pela manhã seria a abertura do evento com autoridades locais e a imprensa. A Galleria Nazionalle Dell’Umbria é um museu de arte, fica no Palazzo dei Priori (Palácio de Priori) no centro histórico de Perugia. Ficamos hospedados no Hotel Priori bem próximo ao Museu.

Na manhã do dia 28 fomos ao Museu e nos deparamos com um banner anunciando o evento Polimaterico com uma grande foto do Lucio, foi nosso primeiro impacto. Fomos recebidos com simpatia e respeito pelo curador da mostra Guiseppe Capparelli e pelo diretor da Galeria Fábio de Chirico sempre acompanhados da tradutora Tiziana Testa que esteve todo momento ao lado do Lucio para auxiliá-lo na comunicação com os italianos.

A abertura do evento aconteceu no auditório do Museu, a foto que estampava o painel atrás da mesa de abertura era do Lucio e todo o material do seminário fazia referência ao trabalho dele. Lucio compôs a mesa, formada por autoridades importantes da cultura da Itália e do Superintendente Fábio De Chirico.

Sendo o convidado especial todas as falas faziam referência ao Lucio e ao trabalho dele. Lucio também teve direito a fala e o fez com segurança e competência sendo aplaudido por todos. Durante a abertura foi apresentado um trecho do documentário onde Lucio pinta uma tela. As palavras do Superintendente sobre o trabalho do Lucio me levou às lágrimas, ele não falava de um rapaz com síndrome de Down que pinta, ela falava de um artista plástico talentoso e competente.

Contou como conheceu o trabalho do Lucio e da sua surpresa ao saber que ele tinha síndrome de Down. “Primeiro conheci e admirei a obra, depois conheci o artista e minha admiração só cresceu.”

No dia 01 aconteceu a abertura da exposição do Lucio que contava com 10 telas, 05 do início da carreira dele com dimensões de 100×200 e 05 inéditas, pintadas especialmente para a Itália cada uma medindo 150×200. Seria também o lançamento das maquetes do Museu para os cegos. O momento, que também comemorava o Dia Internacional da Pessoa com deficiência, contou com a participação do Síndico da cidade de Perugia, de pessoas ligadas à política de inclusão e de muitos jornalistas.

Durante os quatro dias do evento Lucio ministrou o workshop de pintura e participou dos outros workshops, o de teatro com a atriz premiada Rita de Donato moradora de Roma, o de música com o musicólogo e musico terapeuta Gianfranco de Franco habitante de Cosenza/Itália e de restauração e arte contemporânea com a restauradora e especialista Marianna Fonzo também moradora de Roma. Todo o trabalho foi acompanhado de perto pela socióloga e jornalista Esperia Piluso.

O workshop do Lucio foi um grande sucesso e o resultado surpreendente. Durante o workshop Lucio ainda pintou duas telas de 150×200 que ficarão expostas, juntamente com as outras, na Galleria Nazionalle Dell’Umbria até o final de janeiro de 2015 e depois deverão ser apresentadas em outras cidades da Itália incluindo a capital.

No texto da curadoria Giuseppe Capparelli analisando a obra de Lucio Piantino afirma “A “arte” é principalmente comunicação, é a expressão de um ato humano que quer se mostrar ou, ao contrário, se esconder. Uma das características mais importantes para definir o valor de uma obra de arte é a capacidade da mesma de transmitir emoções. Sem emoção o trabalho se anula, perde a consistência e o significado. Lucio tem tudo: consistência e significado. O seu trabalho nos emociona.”

Por Lurdinha Danezy Piantino

 

Confira o texto que do curador da exposição, Giuseppe Capparelli:

A obra de Lucio Piantino por Giuseppe Capparelli

O que mais toca de perto o observador admirando as obras de Lucio Piantino é a absoluta mobilidade da tela. Uma variedade de pontos de fuga acompanham a viagem de quem olha dentro da tela. Nos imergimos num mundo visionário e envolvente e saímos com falta de ar, com a certeza de estar respingados de pigmentos coloridos. Os seus quadros são ritmicamente e constantemente cobertos de granizo acrílico amarelo, vermelho e azul. Ao mesmo tempo a cor preta cai como uma avalanche lenta e regular formando um objeto geométrico cujo significado nos mostra o envolvimento emotivo do autor. Tudo é instável e assimétrico mas ao mesmo tempo equilibrado.

Lucio dança e pinta, ou melhor, o seu modo de pintar é como uma dança ritual quase como um xamânico. Na obra “Água” toda a força da emoção se descarrega na tela e nos dá uma sensação alegre e efervescente, mas ao mesmo tempo mirada e controlada. A sua veia pictórica não se limita ao âmbito sensorial ele atinge um vocabulário de imagens e lembranças do seu passado, ele cita em várias ocasiões artistas do panorama da música brasileira como em “Marisa Monte”, cantora de música popular brasileira que mistura o samba com a música pop internacional, “King Kong” e “É o tchan”, esta última obra é uma homenagem ao conjunto popular de pagode da Bahia.

Coloca-se nesta ótica da lembrança a tela “Um maluco no pedaço” título brasileiro do filme para televisão “Willy”, o príncipe de Bel-Air , porque Lucio usa toda a sua experiencia de vida e a emoldura na tela mais como uma imagem fixa de uma fotografia. Mas o seu caminho criativo não se pode simplesmente conduzir a um passeio no parque de diversões. Os seus monstros não são exorcizados, e eles, como sentinelas trancam as portas da intimidade do pintor, como por exemplo em “Escuridão” onde entra numa dimensão solitária coberta pela escuridão.

O artista absorve tudo e depois transforma em seu. Nos seus trabalhos encontramos com prazer características da pop-art e do Expressionismo Abstrato, o seu modo de pintar copia o “dripping” ou como sugeriu o Superintendente Fabio De Chirico : “Lucio lembra Rothko ao contrário”, porque está completamente submerso pela obra e pela cor.

Agora nos perguntamos qual é o valor artístico de Lucio, ele consegue evocar outros estilos artísticos? Dilema que nos aflige cada vez que observamos todas as produções artísticas.

O vício de muitos autores e críticos de arte é procurar a todo custo a originalidade, tanto dos sujeitos quanto da técnica, quase como se a originalidade fosse um trato distintivo da “artisticidade”. Existe um especialista em arte que pode quantificar quantos são os quadros onde o sujeito principal é a “Madonna com Menino”? Com dificuldade conseguiríamos responder.

A “arte” é principalmente comunicação, é a expressão de um ato humano que quer se mostrar ou, ao contrário, se esconder. Uma das características mais importantes para definir o valor de uma obra de arte é a capacidade da mesma de transmitir emoções. Sem emoção o trabalho se anula, perde a consistência e o significado.

Fonte: Inclusive



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